Ferro e Gaita: A alma sonora da música Tradicional caboverdiana
Na vastidão cultural de Cabo Verde, poucos sons evocam tantas memórias e sentimentos como os do ferro e da gaita. Presentes nas rodas de funaná, nos bailes de aldeia e nas celebrações populares, esses dois instrumentos tradicionais não são apenas meios de fazer música — são símbolos vivos da identidade caboverdiana.
O Ferro e a gaita
O ferro é um instrumento de percussão feito, na maioria das vezes, com barras de ferro reaproveitadas ou varões de construção. Tocado com uma faca ou outro pedaço de metal, o músico segura o ferro de forma firme e marca o compasso com um ritmo rápido e constante, criando um som metálico e cortante que é a espinha dorsal do funaná — um dos ritmos mais característicos do arquipélago.
Mais do que simples instrumento, o ferro simboliza a criatividade do povo que, com materiais simples e improvisados, construiu uma forma original de expressão musical. Durante muito tempo, o som do ferro foi associado à música dos mais pobres, dos camponeses e das zonas rurais, mas hoje é reconhecido como uma peça fundamental do património musical nacional.
A gaita é uma espécie de acordeão diatónico, de origem europeia, que foi adaptada e transformada em Cabo Verde ao longo do tempo. É ela que dá melodia e alma ao funaná, ritmo nascido na ilha de Santiago. Com seu som vibrante e alegre, a gaita lidera a música, conduzindo os dançarinos ao movimento rápido, vigoroso e cheio de energia.
Dominar a gaita exige habilidade, sensibilidade e muito treino. O gaiteiro é, tradicionalmente, uma figura central nas festas e bailes, muitas vezes respeitado e admirado pela comunidade. Através da gaita, contam-se histórias, fazem-se sátiras, celebram-se amores e lutas — é um instrumento que fala por quem o toca.
Símbolos de Resistência e Orgulho Cultural
Durante o período colonial, o funaná — e, consequentemente, o ferro e a gaita — foi marginalizado e até proibido em alguns contextos, por ser visto como "música de negros" e símbolo de rebeldia cultural. Mas o povo resistiu. A música sobreviveu nas tabancas, nos terreiros e nas casas escondidas. E, com o tempo, o ferro e a gaita deixaram de ser marginalizados para se tornarem ícones da cultura nacional.
Hoje, jovens músicos e grupos tradicionais revitalizam o uso desses instrumentos, misturando o som tradicional com elementos contemporâneos como o Kotxi pó, provando que a cultura caboverdiana é viva, dinâmica e orgulhosamente enraizada.
.jpg)

Comentários
Enviar um comentário